"Luxo" ou necessidade?
O transporte público é utilizado por cerca de 67% dos brasileiros. Diariamente, milhões dependem desse meio para se locomover. Agora, imagine uma cidade sem transporte público, onde quem não possui veículo próprio precisa contar com caronas, táxis ou aplicativos para ir de bairros mais afastados ao centro.
Essa é a realidade de Frederico Westphalen, município no noroeste do Rio Grande do Sul, com cerca de 32 mil habitantes.
A ausência de um sistema público de transporte impacta diretamente o cotidiano dos moradores, que, em muitos casos, parecem desconhecer seus próprios direitos. A dependência de meios de transporte individuais pode limitar a participação em atividades sociais e culturais, especialmente para aqueles que não possuem carro ou uma rede de contatos para conseguir caronas. Manter um carro envolve gastos com combustível, manutenção e seguro, o que impacta diretamente no orçamento familiar.
Embora não existam dados oficiais sobre a taxa de motorização em Frederico Westphalen, observa-se nas ruas um grande número de veículos particulares. Essa realidade é reflexo da ausência de um sistema de transporte público eficaz e da necessidade da população de se locomover por conta própria.
Historicamente, o transporte individual sempre foi valorizado no Brasil, o que dificulta a mudança de paradigma e a implementação de políticas públicas que incentivem o uso de transportes coletivos. A cidade, com pouco mais de 32 mil habitantes, pode ser considerada pequena, o que dificulta a viabilidade econômica de um sistema de transporte público, outro ponto é que a cidade não foi planejada para incentivar o uso de transportes coletivos, com ruas estreitas e mal planejadas.
A implementação de um sistema de transporte público em Frederico Westphalen é um desafio, mas não é uma impossibilidade. Desse modo, a elaboração de um plano de transporte integrado e sustentável é fundamental para definir as necessidades da cidade e as melhores soluções para atender à demanda por mobilidade.
Para saber o porquê de uma cidade do tamanho de Frederico Westphalen ainda não possuir meios de transporte público, nossa equipe saiu em busca de respostas, mas antes, vamos fazer uma breve contextualização.
Depoimentos dos moradores
Jaílson Bonatti
Formado em Biologia e doutorando em Educação pela URI - FW, é morador de Frederico Westphalen há cerca de 6 anos, sendo morador do bairro Distrito Industrial por cerca de 4 anos, durante este tempo, enfrentou dificuldades de acesso a transporte para a universidade. Acredita que a falta de transporte público é o resultado de uma cultura de exclusão das classes mais pobres.
Entrevista e gravação por Felipe Kerner.
Estéfani Medeiros
Estéfani Medeiros, é psicóloga e doutoranda em Educação pela URI - FW, reside em Frederico Westphalen há cerca de 10 anos. Estéfani comenta como a falta deste serviço afetou suas oportunidades quando estudante e sobre seu dia a dia sem acesso a transporte público. Acredita que há um posicionamento elitista da gestão municipal referente a este tema, assim, afetando a vida dos moradores de regiões afastadas do centro no que diz respeito a lazer, emprego, cultura, etc.
Entrevista e gravação por Felipe Kerner.
Osvaldo Dalla Nora
Osvaldo Dalla Nora, morou em Frederico Westphalen por toda sua vida, advogado de formação, também atuou como Secretário de Planejamento de Frederico Westphalen por sete meses em 2009, mas teve de deixar o cargo por motivos pessoais. Ele acompanhou o crescimento da cidade de perto e possui opiniões fortes sobre o estado atual das ruas da cidade e sobre a implementação de transporte público, segundo ele, para se pensar na implementação de um transporte urbano, primeiro é preciso repensar as ruas de Frederico Westphalen.
Entrevista e gravação por Felipe Kerner e Mariana Saldanha.
Fernanda*
Fernanda*, moradora que preferiu permanecer anônima, se locomove de carro, mas tem consciência dos impactos da falta de transporte público em uma cidade, aponta principalmente a questão do excesso de veículos nas ruas da cidade, principalmente em horários de pico, o que dificulta a locomoção.
Entrevista e gravação por Felipe Kerner.
Em busca de respostas...
Palmeira das Missões, município vizinho da Princesa do Médio Alto Uruguai, que está com um percurso de 68.7km de distância. Segundo o IBGE, tem aproximadamente 33 mil habitantes. Ambas possuem um número de habitantes muito próximos. Entretanto, a diferença é que uma tem o serviço de transporte coletivo, com um valor acessível aos seus moradores. De acordo com o Jornal Tribuna da Produção, o valor das passagens para o público em geral é de R$2,50, e para estudantes, R$1,00.
Foto aérea de Palmeira das Missôes, por Cristian S. Batista
Frederico Westphalen possui o Transporte Urbano, no qual é operado por uma empresa privada, destinada a estudantes da Universidade Federal de Santa Maria e para o Instituto Federal Farroupilha. O valor da passagem é de R$3,80 cada, um valor nada acessível para os estudantes. Se o aluno não tiver outro meio de se locomover, a única opção de ir até a faculdade, é o transporte. Em conversa com Maria, uma das moradoras, ela afirmou que, pelo valor, percebe-se que não há um olhar ou apoio para os estudantes, ou para o futuro das pessoas e da cidade. Segundo ela, “É uma cidade que cresceu, mas que possui características de uma cidade muito pequena.”
Em uma audiência pública, no dia 01 de outubro de 2024, na Câmara de Vereadores, a questão do transporte público foi pauta. Professores da UFSM/FW e da UERGS/FW, mencionaram as dificuldades de deslocamento enfrentadas por estudantes e pessoas de bairros distantes. Na audiência, a vice-diretora do campus da UFSM/FW, Eliane Pereira dos Santos, representou os estudantes, e questionou o fato de não ter um transporte público de qualidade na cidade. Além disso, ela pontuou que espera para 2025 “um plano e uma execução do transporte público municipal, pois municípios com poderes aquisitivos inferiores a Frederico, possuem transporte público”.
No áudio abaixo podemos ouvir a fala de Eliane durante a audiência pública:
Gravação feita por Maria Eduarda Brasil.
Alessandro Molossi, vereador eleito em Frederico Westphalen, pelo Movimento Democrático Brasileiro - MDB, irá tomar posse do seu cargo no próximo ano (2025), nos concedeu uma entrevista onde afirma que já foram feitas pesquisas sobre a viabilidade técnica e financeira da implementação de transporte público em Frederico Westphalen e o resultado foi que naquele momento, era economicamente insustentável. Alessandro possui uma outra visão sobre o planejamento das ruas de Frederico.
Entrevista e captação de imagens realizadas por Maria Eduarda Brasil e Mariana Saldanha.
O empresário Diogo Mazzonetto, proprietário da Urbano, empresa que fornece transporte para os alunos da Universidade Federal de Santa Maria e do Instituto Federal Farroupilha, nos relata alguns pontos sobre a atual situação de Frederico Westphalen em relação ao transporte público. O diálogo entre a prefeitura e os órgãos responsáveis pela implementação deste serviço, já acontece há anos e vem ganhando força nos últimos tempos devido a expansão da cidade, porém, Diogo ressalta que para começar a fornecer o transporte público em Frederico Westphalen, deve haver subsídio da prefeitura municipal, pois, a arrecadação inicial não seria suficiente para cobrir os gastos e gerar lucro.
Entrevista e captação de imagens realizadas por Maria Eduarda Brasil e Mariana Saldanha.
Possíveis pontos de ônibus em Frederico Westphalen.
Mapa elaborado por Mariana Saldanha
No mapa acima, estão indicados possíveis pontos de embarque para uma eventual implementação de transporte público em Frederico Westphalen. Inicialmente, as paradas seriam limitadas, como explicou Diogo, para reduzir o risco de prejuízos financeiros, enquanto os cidadãos se adaptam ao hábito de utilizar o serviço.
E então?
Ao longo desta reportagem, procuramos entender as razões do porque uma cidade em constante crescimento como Frederico Westphalen, ainda não fornecer um sistema público de transporte aos seus cidadãos. Para isso, ouvimos moradores, políticos e o dono da empresa que fornece o único meio de transporte coletivo da cidade, mas que é de uso exclusivo dos estudantes da Universidade Federal de Santa Maria e do Instituto Federal Farroupilha. Pesquisas realizadas no passado, já não servem de parâmetro para as atuais necessidades da população local, como podemos ver pelos relatos obtidos.
É responsabilidade da gestão pública garantir serviços essenciais como saúde, educação, cultura, lazer e transporte para a população. Em Frederico Westphalen, no entanto, administrações anteriores falharam ou não se dedicaram a implementar um sistema de transporte público de qualidade. Infelizmente, esse cenário parece persistir na gestão atual. Nossa reportagem tentou obter um posicionamento da Prefeitura sobre o tema, mas, até a data de publicação, não recebeu nenhuma resposta.
GALERIA DE IMAGENS
Fotografia por Maria Eduarda Brasil.
Fotografia por Maria Eduarda Brasil.
Fotografia por Mariana Saldanha.
Fotografia por Maria Eduarda Brasil.